AS LIÇÕES DE FERNANDO PESSOA
De Taças de Ovo quente a Insights de Mercado
Em 25 de janeiro de 1926, Fernando Pessoa escreveu o artigo “A Essência do Comércio”, publicado na Revista de Comércio e Contabilidade e mais tarde incluído em Páginas de Pensamento Político, Vol II por António Quadros.
Já imaginou que, em 1926, já existiam conteúdos de marketing sendo publicados nos grandes jornais, e ninguém se dava conta? E mais, que esses textos falavam de algo tão simples quanto um copo para comer ovo quente? Pois é, se você acha que a vida de um marqueteiro moderno é complicada, Fernando Pessoa já estava refletindo sobre estratégias de mercado muito antes de existir internet, Instagram e “copywriting”.
Em 25 de janeiro de 1926, Fernando Pessoa escreveu o artigo “A Essência do Comércio“, publicado na Revista de Comércio e Contabilidade e mais tarde incluído em Páginas de Pensamento Político, Vol II por António Quadros.
Fernando Pessoa e a estratégia de marketing
Nesse texto, Pessoa explora profundamente a função do comerciante, afirmando que o comércio é um serviço ao público. Para ele, o comerciante deve ajustar sua prática às necessidades e expectativas do mercado, moldando-se ao contexto cultural e econômico de onde atua.
Isso em 1926 e, mesmo assim as empresas em sua maioria não aprenderam estas lições, não concordam? O autor conta na época sobre um case no comércio internacional, uma competição sobre taças de ovos quentes. É isso mesmo, taça de ovos quentes.
A competição entre fabricantes alemães e ingleses na Índia para a venda de taças para ovos.
Enquanto os ingleses mantiveram o tamanho padrão de suas taças, os alemães, após observarem os hábitos locais, logo perceberam que os ovos indianos eram maiores do que os europeus e começaram a fabricar suas taças ao tamanho dos ovos locais. Esse simples ajuste garantiu uma vantagem competitiva no mercado indiano.
Pessoa utiliza essa história para demonstrar que o comerciante da época deveria entender profundamente as características e necessidades específicas do mercado em que está inserido, e não tentar impor padrões universais ou pré-concebidos.
Pessoa argumenta no texto que o sucesso no comércio depende de uma atenção aos hábitos e aos consumidores. A ideia de que “o comerciante não deve ter opinião nem personalidade fora do seu comércio” reforça a necessidade de adaptar-se completamente às exigências do público. O comerciante deve deixar de lado seu ego e preferências pessoais, servir melhor seu cliente, construindo um negócio mais próspero e resiliente.
E o que isso tem a ver com marketing?
Esse conceito conecta-se ao que, no marketing moderno, chamamos de “orientação para o cliente“. Hoje, marcas e empresas bem-sucedidas compreendem que a chave para o sucesso não está apenas em criar um bom produto, mas em entender profundamente quem são seus clientes, o que eles valorizam e como suas vidas podem ser melhoradas por meio do produto ou serviço oferecido.
Na prática é que o chamamos hoje de personalização da experiência do cliente, no desenvolvimento de produtos criados para sanar às necessidades específicas de diferentes mercados.
Pontos de vista e reflexão
Um dos pontos de vista mais significativos que entendo que Fernando Pessoa trouxe é a ideia de que o comerciante não deve ter personalidade. Essa afirmação pode parecer até radical, mas ela critica algo que vemos muito no mercado: o excesso de ego. A lição que fica para o comerciante ou empresário atual é que a flexibilidade e o desapego pessoal são de suma importância.
Outro ponto crucial levantado por Pessoa é a valorização da pesquisa e do estudo do comportamento humano. Ele propõe que a prática comercial requer quase um “cientista social”, alguém que estuda as motivações, hábitos e preferências do consumidor.
Isso está muito alinhado com a abordagem moderna de consumer insights, onde dados e comportamentos dos consumidores são analisados detalhadamente para guiar decisões empresariais.
No meu trabalho com marketing, sempre enfatizo a importância de analisar o cenário mercadológico e compreender as particularidades de cada negócio. O que dá certo para o meu concorrente pode não funcionar para mim, justamente porque cada organização tem sua cultura, seus valores e uma forma diferente de se posicionar diante do cliente.
Mesmo que estejamos no mesmo segmento, a maneira como cada empresa é percebida pode variar muito de acordo com suas práticas, sua comunicação e até mesmo os detalhes sutis da experiência oferecida. Como Fernando Pessoa destacou ao observar o comércio internacional de taças de ovos, o sucesso está em entender o contexto e adaptar-se a ele, não em replicar o que funcionou para outros.
Grande erro das empresas sem estratégia
Muitas empresas falham por simplesmente copiar o que veem no mercado, sem levar em consideração suas próprias especificidades e as expectativas de seu público. Compreender essas diferenças e como a cultura organizacional impacta a visão que o cliente tem da sua marca é um dos principais fatores que separa negócios bem-sucedidos daqueles que apenas seguem tendências sem um propósito claro.
Em suma, a visão de Fernando Pessoa sobre a necessidade de adaptar-se ao mercado é mais relevante do que nunca. O sucesso comercial — seja em 1926 ou nos dias de hoje — depende de uma análise cuidadosa do cenário mercadológico e da capacidade de identificar as particularidades de cada empresa.
No meu trabalho, sempre reforço que, antes de qualquer ação, é essencial compreender profundamente o ambiente em que você está inserido e as expectativas dos seus clientes. Essa é a chave para construir uma marca que se destaca no mercado, ao invés de simplesmente seguir os passos da concorrência.
Gostaria de agradecer ao meu amigo Diego Godoy, headhunter na MUUDA.work, por ter me apresentado a este texto de Fernando Pessoa que me inspirou a refletir sobre ele e escrever.
Diego que possui uma vasta experiência em multinacionais como PwC, Michael Page e Walt Disney Company, Diego é um profissional que admiro muito. Seu olhar afiado para o mercado e sua capacidade de identificar talentos são notáveis, e fico honrado em poder contar com ele como amigo e inspiração. A troca de ideias com pessoas como Diego enriquece qualquer conversa. Muito obrigado, Diego, por compartilhar esse conhecimento e abrir espaço para mais uma reflexão sobre o mundo dos negócios e do marketing!