BLACK FRIDAY OU BLACK FRAUDE?

Promoções e mais promoções, será que alguém ainda acredita?

O brasileiro é tão criativo que criou a “pré-Black Friday”, uma prática que chama a atenção pela falta de correspondência com o propósito original da data e pela proliferação de ofertas que não necessariamente representam uma real vantagem ao consumidor.

promocoes-black-friday-natal
Foto: Reprodução/Freepik

No cenário do varejo brasileiro, as promoções são tão comuns que parecem fazer parte do cotidiano do consumidor. Se observarmos os maiores players de mercado, quase nunca encontramos um mês sem alguma promoção. E, muitas vezes, o “desconto imperdível” não está restrito a uma categoria específica de produtos para atender à sazonalidade ou uma demanda pontual, é bem pelo contrário: a loja inteira em descontos, geralmente com o mantra “enquanto durar o estoque”.

Essa forma brasileira de ser, além de mostrar uma característica cultural do varejo no Brasil, levanta algumas reflexões importantes sobre os impactos dessa estratégia a longo prazo. O público brasileiro parece ter sido, aos poucos, “treinado” para comprar com base nessas promoções incessantes, muitas vezes tornando a compra por preço o principal estímulo. No entanto, essa cultura do “preço baixo todo dia” pode ter consequências na percepção de valor dos produtos e até mesmo na saúde financeira das próprias empresas. É preciso se questionar até que ponto essa “pressão do desconto” se torna um risco para o próprio mercado, e avaliar alternativas que engajem o consumidor de forma genuína.

Ao longo do tempo, a frequência e intensidade das campanhas promocionais têm criado uma espécie de resistência do consumidor a preços cheios. E não é apenas a frequência das promoções que provoca essa reação, o próprio consumidor começou a suspeitar da veracidade dos descontos. Isso fica ainda mais evidente quando a tão famosa Black Friday se aproxima – uma data importada dos Estados Unidos, onde tradicionalmente ocorre na última sexta-feira de novembro (este ano será no dia 29).

No Brasil, no entanto, a campanha começou a se expandir para um mês inteiro, e o brasileiro é tão criativo que criou ainda a “pré-Black Friday”, uma prática que chama a atenção pela falta de correspondência com o propósito original da data e pela proliferação de ofertas que não necessariamente representam uma real vantagem ao consumidor.

Black Fraude

A Black Friday, que deveria ser uma oportunidade genuína de desconto e incentivo ao consumo, infelizmente passou a carregar uma fama negativa entre o público brasileiro. Conhecida por muitos como “Black Fraude”, essa data tornou-se um símbolo de promoções enganosas, em que alguns varejistas elevam preços algumas semanas antes da Black Friday para, então, oferecer descontos ilusórios. Com esse tipo de prática, o consumidor fica cada vez mais cético, e a confiança no varejo se desgasta, especialmente quando ele percebe que as promoções são, muitas vezes, fraudes, é o varejista tentando trolar o consumidor. Essa prática, além de prejudicar a reputação do setor, mina a credibilidade de uma data que poderia ser muito mais explorada como um movimento positivo no calendário de vendas.

Entretanto, há uma oportunidade para os varejistas que desejam se destacar e realmente entregar valor ao consumidor na Black Friday. Se você é empresário ou está no mercado e planeja uma ação para a Black Friday, minha principal sugestão será sempre de apostar na transparência.

Comunique claramente as ofertas e condições da promoção e concentre suas ações no próprio dia 29 de novembro, garantindo que as ofertas estejam alinhadas com a expectativa do cliente e que sejam de fato autênticas. Uma campanha de Black Friday feita com respeito ao consumidor e sem subterfúgios, pode engajar o público de forma saudável, contribuindo para fortalecer a marca e construindo uma relação de confiança – uma vantagem que pode fazer toda a diferença para quem busca engajar o público de forma sustentável.

Black Friday ou Campanha de Natal?

Outro ponto importante a considerar é a questão do planejamento estratégico. Será que realmente vale a pena colocar tanta energia e recursos em uma campanha de Black Friday, que muitas vezes ainda gera desconfiança entre os consumidores?

Vale ponderar a possibilidade de concentrar esforços em uma campanha de Natal, que não só dura mais tempo, como também permite um relacionamento mais profundo e significativo com o cliente. A campanha natalina oferece uma oportunidade única de trabalhar a conexão emocional com o público, algo que é difícil de alcançar em uma campanha de desconto intensivo como a Black Friday.

Se for bem executada, uma campanha de Natal pode trazer benefícios além das vendas imediatas. Em vez de focar exclusivamente na quantidade de produtos vendidos, é possível trabalhar com margens mais adequadas, valorizando o relacionamento e fidelizando o cliente. Essa estratégia permite que a marca se comunique com transparência, mostre sua identidade e fortaleça o relacionamento com o consumidor, valorizando a experiência e entregando algo que vá além de apenas um preço baixo.

Mitos do varejo

Para qualquer negócio, principalmente no varejo, é essencial estar atento aos mitos e fórmulas mágicas que muitas vezes surgem no mercado. Em um cenário de alta competição e pressão por vendas, é fácil cair na tentação de fórmulas milagrosas que prometem aumentos de vendas em pouco tempo.

No entanto, a realidade do mercado é bem mais complexa, e fórmulas universais geralmente não funcionam, pois cada empresa é única em sua cultura organizacional. Influenciadores nas redes sociais e consultores que vendem soluções prontas para o sucesso podem, em alguns casos, representar um perigo ao criar expectativas irreais. É importante lembrar que a estratégia de uma empresa deve ser construída de acordo com seu core business, seu propósito e seu público específico.

Cada empresa tem uma dinâmica própria e está inserida em um contexto único. Por isso, é sempre mais vantajoso apostar em estratégias que respeitem essas características, do que em soluções genéricas que não consideram as particularidades do negócio.

Para fechar, a reflexão mais importante que deixo é sobre a necessidade de planejamento e consistência. Uma estratégia de marketing eficaz deve ser construída com base em ações coerentes, que estejam alinhadas com o posicionamento da marca e com os objetivos de longo prazo. Não adianta investir em promoções excessivas e em campanhas massivas se, no final, isso prejudica a percepção de valor dos produtos e enfraquece a identidade da marca. O varejo brasileiro tem muito a ganhar ao apostar em campanhas que sejam planejadas com antecedência e executadas com autenticidade.

O consumidor de hoje valoriza cada vez mais a transparência e a responsabilidade das marcas. Ele está mais atento ao que compra e ao motivo pelo qual compra. Portanto, apostar em uma comunicação clara e honesta, respeitando as expectativas do público, é uma forma de construir uma relação duradoura e sustentável. Promoções são, sem dúvida, uma ferramenta poderosa para atrair clientes, mas é preciso saber dosar e utilizar essa estratégia com inteligência para evitar que se torne um tiro pela culatra.

Em um mercado cada vez mais saturado de ofertas e de promessas de sucesso fácil, construir valor e confiança pode ser o verdadeiro diferencial. Ao invés de focar apenas nas vendas do momento, pense no relacionamento que a sua marca pode construir. Afinal, são essas conexões que garantem a sobrevivência e o sucesso de qualquer negócio, mesmo em tempos de “promoções infinitas”.