Exemplos de coragem!

Entre barreiras e afeto: a jornada de mães migrantes em Curitiba

Mães migrantes reconstroem a vida em Curitiba em busca de um futuro melhor aos filhos

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À esquerda, Luisis Muscarneri e seus dois filhos. À direita, Marilym Merchán e seu filho mais novo. (Arquivo Pessoal/Cedido ao Massa.com.br)

O significado de mãe vai muito além de um simples título ou vínculo biológico — é símbolo de amor incondicional, proteção, cuidado e presença constante. Para as mães migrantes, essa vivência materna se intensifica, pois elas carregam não apenas a responsabilidade de cuidar de seus filhos, mas também o peso da saudade, da adaptação e da luta por uma vida melhor.

Curitiba é um dos principais destinos de migrantes internacionais no Brasil. Dados do Sistema de Registro Nacional Migratório (SISMIGRA), do Governo Federal, indicam que, em 2024, a capital paranaense recebeu 5.546 venezuelanos, por exemplo.

Ainda conforme o SISMIGRA, Curitiba está entre as 10 cidades brasileiras que mais receberam migrantes em 2024. Neste período, a capital paranaense acolheu mais de 80% venezuelanos. Além disso, o município aparece no topo da lista como a cidade com maior presença de estrangeiros no Paraná, seguida por Foz do Iguaçu e Cascavel.

A diversidade cultural no Paraná segue em expansão, com representantes de 195 nacionalidades vivendo em 196 dos 399 municípios do estado. Segundo o SISMIGRA, no primeiro semestre do ano passado, mais de 175 mil migrantes chegaram ao Paraná. Os dados foram divulgados com base nas solicitações e expedições do Registro Nacional Migratório, fornecidas pela Polícia Federal.

Com o aumento de novos estrangeiros em Curitiba, cresce também a presença de mães migrantes que enfrentam o desafio de reconstruir a vida longe de suas origens. Em meio às dificuldades, essas mulheres demonstram uma força admirável ao cuidar de suas famílias e buscar melhores condições para seus filhos.

Mãe migrantes constroem uma nova história em Curitiba

Luisis Muscarneri, de 41 anos, é venezuelana e mãe de três filhos. A migrante escolheu a capital paranaense há quase seis anos e, atualmente, mora no bairro Santa Felicidade: “A instabilidade do meu país me motivou a migrar, mas não pensei inicialmente em vir ao Brasil. Estava buscando outro lugares, mas me apaixonei quando conheci Curitiba”, disse.

Quando a venezuelana chegou em Curitiba, seus filhos tinham sete, nove e 11 anos. “Foi uma experiência desafiadora chegar ao país e entrar em uma cultura diferente não sabendo falar português. Nós viemos um pouco antes da pandemia e isso complicou muito a adaptação aqui no Brasil, mas somos muito gratos e felizes por morar aqui”, completa.

Juntando a força feminina e materna, Luisis decidiu criar o Instituto Autentica’s Brasil, uma organização sem fins lucrativos que se dedica a acolher mulheres migrantes e refugiadas em Curitiba. Na Venezuela, ela se formou em Administração com especialização em Gerência. “Aqui no Brasil, estou cursando Tecnologia em Secretariado pelo Instituto Federal do Paraná (IFPR). Além disso, sou terapeuta especializada em mulheres, atuo como palestrante e sou líder migrante, trabalhando em políticas públicas específicas para mulheres migrantes e refugiadas”.

Ser mãe migrante é enfrentar desafios para oferecer segurança e oportunidades aos filhos. E, junto com tudo isso, também vem a saudade de casa: “O que mais me desafiou foi estar longe da minha família e dos meus amigos. Tenho que me adaptar a diversas coisas para morar legalmente no Brasil, especialmente por não ter conseguido a revalidação dos meus estudos e por não estar trabalhando na minha área de atuação”, conta Luisis. 

A mãe de Luisis mora na Venezuela e a filha, agora com 17 anos, foi morar na Itália com a tia. “Sempre falo para a minha mãe vir morar conosco ou ir para a Itália ficar com minhas irmãs. Eu me inspiro na força da minha mãe e das minhas avós, que foram muito corajosas”, reforça. Ela afirma que a mãe, a filha e as irmãs estão presentes na luta diária dela por outras mulheres.

Ser mãe em terras estrangeiras é um ato diário de coragem. A mulher migrante carrega sonhos, memórias e a responsabilidade de criar filhos entre culturas, línguas e realidades muitas vezes adversas. “A pessoa que mais me inspira é a minha filha. Quero ser um exemplo de força, coragem e superação para ela, um modelo de inspiração para que não tenha medo de crescer e brilhar”, conta Luisis.

A capital paranaense trouxe não apenas um novo endereço, mas também presentes valiosos para a vida dela — encontros, oportunidades e aprendizados. Foi em Curitiba que a venezuelana encontrou a chance de transformar sua história e a de tantas mulheres, achou acolhimento, e um novo amor. “Conheci meu marido no dia em que cheguei na cidade. Estava muito doente e ele cuidou de mim e dos meus filhos. Estamos casados há quase 4 anos”, relata.

Além da mãe biológica, Luisis também ganhou uma “mãe de coração” no Brasil. “Nós fizemos um ‘match’ porque compartilhamos o desejo de empreender. Convidei ela para ser vice-presidenta do Instituto Autentica’S Brasil e, desde então, ela está ao meu lado. Sou muito grata a ela pelo carinho e por ser uma ‘mãe’ maravilhosa”, diz. Com espírito materno, a venezuelana também tem dois “filhos de coração”: “Ambos moram no Brasil. Um deles vive em Boa Vista, tem 25 anos e é venezuelano. Sinto muito orgulho de ter cuidado dele quando era criança. Já a minha menina ficou comigo quando a mãe faleceu. Seu pai é do Paquistão. A considero como filha e a irmã dos meus filhos”, afirma.

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O recomeço de mães venezuelanas em Curitiba

Marilym Merchán, de 34 anos, tem dois filhos e mora no bairro Novo Mundo, em Curitiba. Natural da Venezuela, ela deixou seu país de origem em meio à crise econômica e social que afetou milhões de venezuelanos. Em 2022, ela decidiu recomeçar a vida com sua família na capital paranaense: “Escolhi Curitiba por ser uma cidade muito segura e com boas oportunidades”, relata.

Atualmente, Marilym trabalha como confeiteira em uma padaria da cidade. Além disso, a venezuelana é empreendedora: atua como hipnoterapeuta e terapeuta clínica. Assim como Luisis, ela também faz parte da equipe do Instituto Autentica’S Brasil.

“Chegar a um novo país é como nascer de novo, sabe? Um misto de medo e esperança que a gente sente na alma. A adaptação não aconteceu da noite para o dia. Houveram momentos de frustração, de saudade apertando no peito e de obstáculos, mas tudo passa”, conta.

Os filhos de Marilym tinham três e 12 anos quando chegaram ao Brasil. “A minha decisão como mãe venezuelana de migrar foi motivada pela necessidade de proteger os meus filhos e de procurar um ambiente onde eles possam ter acesso às necessidades básicas, segurança e um futuro com maiores oportunidades”, diz. Ela afirmou que a combinação da crise econômica, do colapso do sistema de saúde e da insegurança fez com que muitas famílias, assim como a dela, vissem a migração como a única opção viável.

O maior desafio para a venezuelana, além da saudade da família, foi se adaptar a uma língua nova. “Para mim e meus filhos, o maior obstáculo foi aprender português. Agora já sabemos um pouco, mas antes tínhamos dificuldade de se comunicar no dia a dia, seja em consultas médicas, na escola ou na busca por emprego”, relata.

Apesar dos obstáculos enfrentados no processo de migração, Marilym acredita que valeu a pena recomeçar em um novo país para oferecer uma vida melhor aos filhos. “Como estou longe da minha rede de apoio, sinto saudades. Enfrentei problemas financeiros, mas encontrei um bom emprego. Mas, sem o domínio da língua e com a necessidade de validar diplomas no Brasil, o processo fica complexo”, afirma.

Além de precisar lidar com a mudança de país, Marilym também precisou adaptar os filhos a uma nova cultura, língua e escola. “Fomos acolhidos e temos oportunidades. Mergulhamos na cultura, aprendemos os costumes e a falar português… Mas nunca vamos esquecer de onde viemos”, conta. Para a venezuelana, quanto mais o migrante se comunicar, mais portas se abrirão e mais o estrangeiro se sentirá parte do país.

Em Curitiba, a venezuelana conheceu seu atual namorado, com o qual planeja se casar em breve. Ainda, Marilym também conta que outras pessoas de sua família também vieram para a capital paranaense: “Agora a minha mãe mora aqui em Curitiba. Junto com ela, também vieram um irmão e dois sobrinhos. Me sinto segura e feliz pela minha mãe estar aqui. Sempre que podemos, nos reunimos. Sinto muito orgulho dela”, finaliza.

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A maternidade migrante é feita de renúncias silenciosas e amor resiliente — é reinventar o lar longe de casa e proteger os filhos em meio às dificuldades. E para todas as mães que carregam amor, coragem, força e esperança, um feliz Dia das Mães!